Tuesday 15 September 2009

Passeio ao Piódão e á serra do Açor - 19 e 20 de Setembro

Piódão, assim, ao anoitecer, parece um presépio – nome por que também é conhecido – ou uma aldeia dos contos de Hans Christian Andersen. Desce em cascata por uma encosta da Serra do Açor e deixa, mesmo na penumbra, entrever uma harmonia na sua malha urbana de fazer inveja a PDMs, tão complexos quanto inúteis. Luzinhas extravasam de janelas pequenas, sem desvendar o encanto das habitações que sabemos serem construídas em xisto, das ruelas muito estreitas feitas na mesma pedra, dos idosos vestidos de negro… E o silêncio, ainda mais cerrado que a noite, apenas reaviva o mistério de tão mágica aparição, que o regresso da manhã cedo irá desvendar, mas não desiludir.

Adiada a incursão pela povoação para o dia seguinte, a caminho da Pousada do Desagravo, em Vila Pouca da Beira, não encontraremos os ursos e os lobos – que aterrorizavam as gentes destes montes há meia dúzia de séculos, no caso dos primeiros, ou há poucas décadas no que toca aos lobos –, nem os salteadores que aqui se refugiavam da justiça, enquanto de passagem deitavam mão à mercadoria dos comerciantes mais incautos (diz-se que um dos assassinos de Inês de Castro, o único a sobreviver à fúria de D. Pedro, terá vivido por estas bandas).
Apenas nos fazem companhia a Lua, quase cheia, umas poucas estrelas e a memória de histórias contadas por José Fontinha Pereira, um filho da terra, no seu livro “Piódão: Aldeia Histórica, Presépio da Beira Serra” – um feliz relato de episódios das vidas de pastores, agricultores, mineiros, apicultores e criadores de cavalos que, na impossibilidade de sustentarem as suas famílias numerosas, a partir do século XX, foram abandonando Piódão (resta cerca de uma centena de habitantes, quase todos idosos), mas nos legaram um património histórico admirável, tanto a nível monumental como etnográfico, que iremos explorar.

Presentes da natureza
Qualquer que seja a altura do ano, qualquer que seja o caminho tomado (diz-se que todos vão dar ao Piódão, tal como a Roma, dada a profusão de estradinhas que desembocam na sede de freguesia de Arganil), a natureza não pára de surpreender com as suas cores improváveis, num mundo vestido a cinza de betão. O branco da neve e a transparência das cascatas que escorrem dos socalcos íngremes da serra no Inverno dão lugar, na Primavera, ao lilás das urzes e ao amarelo das giestas e das carquejas. Já no Verão, impressionam as cerejeiras carregadas de vermelho e, na estação seguinte, os medronheiros vestidos da mesma cor, enquanto os castanheiros preferem, na altura, os tons de mel.

A aldeia de Piódão, classificada como Imóvel de Interesse Público desde 1978 e integrada no Programa de Recuperação das Aldeias Históricas de Portugal, em 1994, é que parece imutável (apesar de algumas habitações terem sido rebocadas antes de 1978). Aliás, a arquitectura singular das suas pequenas moradias confere-lhe um ambiente algo anacrónico, mas sem dúvida nostálgico, que a falta de precisão quanto à data em que se terão para aí deslocado os primeiros habitantes apenas vem reforçar (sabe--se que até finais de 1400 terá pertencido à freguesia de Lourosa e que entre 1635 e 1676 esteve integrada na freguesia da Aldeia das Dez).
A disposição das casas numa encosta abrigada é típica de um povoamento medieval irregular de montanha, que certamente cresceu à medida que a população ia aumentando. Actualmente, a povoação consiste num amontoado de casas de xisto semelhantes entre si (parecem ter sido todas construídas de uma só vez), que se espraia pelo morro em forma de altar ou anfiteatro, com todas as suas ruelas empedradas em xisto ou talhadas na rocha. Pelo meio passa uma levada, onde a água corre por força da gravidade.

A exploração deste lugar é nada mais nada menos que uma aula sobre os modos de vida de outros tempos, já que a maioria das casas guarda a estrutura de antigamente. São compostas por dois pisos, sendo o térreo destinado à arrecadação das alfaias agrícolas, arcas dos cereais e salgadeiras, onde se guardava e conservava a carne de porco. No primeiro piso encontramos a habitação propriamente dita, bastante escura e parca de mobiliário.
O interior é construído em madeira de castanho e o telhado suspenso em barrotes cobertos por xisto (o material predominante na região).

A homogeneidade da cor com que as portas e os frisos das janelas foram pintadas, azul magrebino, é mais uma consequência do isolamento a que o Piódão esteve sujeito – era a única tinta existente na loja. Por cima de muitas das portas existem ainda pequenas cruzes que, acredita-se, afastam as trovoadas. No Domingo de Ramos os fiéis levam um ramo de oliveira para benzer e, nas noites de tempestade, fazem com ele uma cruz que colocam em cima das brasas da lareira ou da entrada de casa, invocando, deste modo, a protecção de Santa Bárbara.

Podemos afirmar que o maior monumento de Piódão é a aldeia no seu todo, mas a Igreja Matriz (século XVII), dedicada a N. Sr.ª da Conceição, é um edifício interessantíssimo que testemunha a religiosidade dos habitantes. Pensa--se que, no local onde está actualmente edificada, teria existido uma pequena capela, da qual resta uma imagem calcária de N. Sr.ª da Conceição, colocada no exterior da actual igreja. Esta última sofreu várias obras de beneficiação, uma vez que os retábulos interiores datam do século XVIII e as obras de talha são da transição do século XIX para o XX, altura em que foi ampliada e remodelada e a sua frontaria construída e planeada pelo Cónego Nogueira. Ameaçava ruir e o restauro foi feito ao sabor do neo-barroco, ecléctico e romântico, muito comum na época.

Gentes de outras épocas
A aldeia que agora chamamos de Piódão não é, na verdade, a povoação original. Houve, em tempos, num vale muito próximo, um outro Casal de Piodam (“a gente ou o povo que anda a pé”), actualmente reduzido a ruínas envoltas num denso matagal. Embora não se saiba muito bem que motivos levaram essa povoação ao abandono, pensa-se que, devido ao calor, sofria com as investidas das formigas que devoravam o mel, uma das suas principais riquezas e, por outro lado, não dispunha de água suficiente para cobrir as necessidades de uma população em expansão. Por outro lado, é provável o desejo de diversificação da produção de cereais e que os habitantes do velho Piódão se tivessem dispersado pelo vale, dando origem a novos focos populacionais.
De qualquer modo, as duas aldeias partilham uma história muito mais antiga: os habitantes de ambas descendem dos Lusitanos, os mais antigos povoadores dos Montes Hermínios que se tem conhecimento (compostos por um povo oriundo do Norte de África, com características comuns aos berberes, e por outro que se movimentou a partir da zona Setentrional dos Alpes, os celtas, dos quais se terão herdado as actividades relacionadas com a pastorícia e o cultivo dos cereais, nomeadamente da cevada).
Ao longo dos tempos, as populações foram criando condições para a subsistência, conquistando à serra com suor cada pequena leira, cultivada em socalcos. E assim viveram durante séculos do mel, azeite, queijo, centeio e milho a que, já mais recentemente, agregaram a exploração do carvão e das minas de volfrâmio. Curavam as maleitas com responsos e mezinhas e quebravam o isolamento com grandes caminhadas (são deliciosas as histórias, por exemplo, das “galinheiras”, mulheres que calcorreavam caminhitos até à Covilhã, de cesta à cabeça, em dias de neve ou calor abrasador, recolhendo ovos pelos montes que depois vendiam na cidade maior).
Só que as dificuldades deixaram um dia de fazer sentido, perante o estilo de vida das grandes cidades e, a partir de meados do século XX, a maioria emigrou para outros países ou para o litoral. Repare-se que a estrada de Piódão só foi construída em 1972 e a instalação de energia eléctrica, meia dúzia de anos depois. Demasiado tarde para fixar as gentes de Piódão à sua terra, agora ressuscitada, graças ao número crescente de visitantes (sobretudo portugueses e espanhóis) que viajam, através desta aldeia remota, pela história de um Portugal quase esquecido.

Passeios de encantar
Nas imediações de Piódão, integrado na Paisagem Protegida da Serra do Açor, existe um local de visita obrigatória, dada a sua beleza natural: a Mata da Margaraça. Constitui um raro testemunho da vegetação espontânea da paisagem serrana, uma importante reserva genética de vegetação e animais selvagens e exibe uma vitalidade e riqueza em nada comparável às monótonas plantações de pinheiros ou de eucaliptos.
Sugerimos, por isso, que dê um passeio a pé, para encontrar quedas de água, degraus talhados na rocha que sobem ao longo da levada da água ou as raras casas agora reconstruídas, como a Casa da Eira, mobilada como em tempos idos. Passear pelo bosque irá revelar-lhe um sem número de carvalhos e castanheiros, cerejeiras bravas e azevinhos, avelaneiras ou mesmo loureiros, e muitos outros arbustos como o medronheiro que, de tão antigo se fez árvore. Na mata ouvem-se os cucos, as rolas e as gralhas pretas ou as corujas, e entre os tufos de martagão, descobrem-se por vezes vestígios de doninhas e raposas, de genetas ou de javalis. O açor, a ave que dá nome à Serra, ainda paira nos céus, ao lado do gavião ou da águia de asa redonda, pacientemente esperando alguma cria incauta que lhes sirva de repasto.
Cruzes feitas de ramos de oliveira e benzidas no Domingo de Ramos, que os fiéis colocam à entrada de casa, invocando a protecção de Santa Bárbara, nos dias de trovoada

Fraga da Pena é como que a sala de visitas da Mata da Margaraça – local paradisíaco onde o murmurinho das águas, que caem em cascata de uma altura de setenta metros pela parede de xisto, e o respirar das folhas verdes da frondosa vegetação faz coro com o chilrear da passarada que habita este espaço delicioso. Aqui e acolá a vegetação adensa-se e, nessa altura, surgem pequenas lagoas entre bancos e mesas rústicas que convidam ao piquenique.

Informações úteis

Como ir
A partir do Porto: Tome a A1 em direcção a Lisboa e saia no IP3, rumo a Viseu. Prossiga quase até Oliveira do Hospital (IC6) e vire em direcção a Moita da Serra. Continue para Gândara Espariz em direcção a Coja. Aí siga as placas indicativas de Piódão.
A partir de Lisboa: Tome a A1 em direcção ao Porto e saia no IP3, rumo a Viseu. Prossiga quase até Oliveira do Hospital (IC6) e vire em direcção a Moita da Serra. Continue para Gândara Espariz em direcção a Coja. Aí siga as placas indicativas de Piódão.

SERRA DO AÇOR:Localização – A Serra do Açor localiza-se no centro de Portugal Continental, perto da Serra da Estrela. A sua paisagem é protegida e localiza-se nas freguesias de Benfeita e Moura da Serra, concelho de Arganil e distrito de Coimbra.A Serra do Açor trata-se de uma área protegida, com uma vegetação muito rica na sua diversidade. A Água é uma presença constante, pois mesmo quando nos afastamos dos cursos de água o som perdura. São as ribeiras que nascem na serra.
Altitude – A Serra do Açor tem 1,339 km de altitude. O seu ponto mais elevado é o Colcurinho.
Flora – Por entre os cumes da Serra situa-se no termo de Arganil a Mata da Margaraça. Esta ocupa uma encosta exposta a norte entre os 400 m – 800 m de altitude constituído uma amostra de vegetação desta região tal como existiria séculos atrás. Resto de uma antiga floresta a Margaraça tem como espécies vegetais predominantes o carvalho– alvarinho e o castanheiro. Presentes ainda algumas plantas de cariz mediterrânico como o medronheiro e o folhado, exemplares de grande porte o azereiro para além de cerejeira-brava e da aveleira.Acrescente-se uma elevada cobertura de musgos, líquidos e fungos, inúmeros fetos e espécies ornamentais raros no território Português como o Martagão e o Selo–de–Salomão.Na área de paisagem protegida da Serra do Açor existe uma variedade considerável de habitats cada um deles albergando várias espécies. Do conjunto de habitats destacam-se os carvalhais, os povoamentos de espécies lauróides (loureiro, azereiro, medronheiro) os galerias ribeirinhos e os povoamentos de azereiro. Mas podem ser observados também as comunidades que se desenvolvem sobre substrato rochosos e também urzais, povoamento de sobreiros e pinhais.
Fauna - Mamíferos – As características da vegetação permitem a existência de uma variedade de mamíferos considerável: a raposa, a fuinha e a gineta que são carnívoros. Entre os pequenos mamíferos de que se alimentam está o rato-do-campo, o rato–cego, o rato–toupeiro, o musaranho–de– dentes–vermelhos e o rato–dos–pomares. É de realçar a diversidade de invertebrado como as borboletas, tendo já sido inventariadas 240 espécies de 20 famílias. Aves- no domínio da avifauna destacam-se a coruja-do-mato, o gavião e o açor.O açor é uma ave de aspecto robusto, com garras poderosas. O ventre é branco, com barras cinzentas escuras. A silhueta de voo do açor é caracterizada pelas suas asas curtas e arredondadas e pela cauda comprida que quase mantém sempre fechada. Alimenta-se quase só de aves, tais como: pombos, rolas, gaios, gralhas e estorninhos que caça em voo, atacando-os de cima.
Répteis e anfíbios - Destacam-se duas eepécies: a salamandra-de-cauda-comprida, o lagarto-da-água. Outros anfíbios aqui habitam: a râ-castanha, o sapo-parteiro comum, o sapo-espinhoso, a salamandra-de-pintas-amarelas, o tritão-marmorado e o tritão-de-ventre-laranja. Entre os répteis, os mais comuns são o licranço e a cobra-de-água-de-colar.
Invertebrados- foram inventariadas cerca de 240 espécies pertencentes a 20 famílias.

PERCURSO PEDESTRE para Sábado dia 19/9:Distância: cerca de 10 km. Partida do Piódão, passagem por Foz d'Égua e Chãs d'Égua.
IMPORTANTE: Levar farnel, botas de caminhada adequadas, roupa confortável, impermeável, chapeu, água.

Alojamento:
Bungalows do parque de campismo da Ponte das 3 entradas. Ver http://www.pontedas3entradas.com/?action=viewCat&cid=64&aid=&lid=2 A capacidade dos bungalows é para 6 pessoas. Têm um quarto com 1 cama casal + 1 sofá cama + 1 quarto com 2 camas individuais.

O preço é 30 € as 2 noites.

Transporte:O transporte será feito em carros particulares, quem tiver disponibilidade para levar carro e dar boleia agradeço que avise. Quem necessitar de boleia também o deverá comunicar a fim de nos organizarmos na deslocação. A partida será na 6ª feira no final da tarde, hora e local ainda a combinar.

Percurso:
Partindo de Lisboa segue-se pela A1.
Seguir pelo IP3 na direcção de Viseu.
Sair na saída para Arganil.
seguir para para Este pela IC6 que depois se transforma em N17 na d.irecção de Oliveira do Hospital.
Sair para sul na direcção de Vila Poca da Beira e depois Ponte das 3 Entradas.
Procurar parque de campismo.

Miguel Pereira
migcostaper@gmail.com

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